Após ter resultado ruim em 2020 por causa da pandemia, a indústria automobilística tinha a esperança de um bom início de ano no Brasil. Porém resultados mostram um alerta vermelho no setor. Começando o ano em queda de quase 30% nos licenciamentos, além de um recuo de 35% nas exportações em relação a dezembro.
Além de todas as dificuldades que a pandemia trouxe ao setor, a indústria automotiva teve que lidar com a alta do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços) no estado de São Paulo. A relação do setor automotivo que antes era boa com a gestão agora está abalada. O aumento do Imposto no estado paulista foi um dos temas mais abordados pela direção da Anfavea (Associação das Fabricantes de Veículos).
Segundo a Anfavea, é normal que janeiro tenha números menores que dezembro, que costuma ser um mês forte em vendas. A queda na comparação com janeiro de 2020, por exemplo, foi de 11,5%. Entretanto, a associação considera o resultado preocupante. E começa 2021 sem fazer as tradicionais projeções.
“Temos questões indefinidas da pandemia, tais como a falta do abono emergencial, o déficit fiscal, possíveis aumentos da taxa de juros, problemas com fornecimento de matérias-primas. Ainda não dá para tirar conclusões. Historicamente, janeiro fica abaixo de dezembro. Vamos acompanhar os próximos meses para entender o ano. Continuamos com neblina”, resume Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea em reportagem ao Jornal Estadão.
Parada da indústria automotiva
Segundo avalia o economista Claudio Considera, coordenador do Monitor do PIB do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) em reportagem a UOL, a paralisação temporária da indústria automotiva deve impactar a produção industrial e também o desempenho do PIB em 2021, e diz também: “Acontece o seguinte: isso é só o peso direto. Porque a indústria automotiva compra plástico, laminados de aço, produtos químicos, produtos metálicos, produtos de borracha”, enumera o economista. “Tudo isso deixa de ser demandado quando você para de produzir automóveis.”
As montadoras acham um absurdo o Governo mexer na parte tributária do setor, aonde o qual já está sendo prejudicado com as dificuldades diárias, e os efeitos que o vírus tem causado. É delicado falar de aumento em carga tributária em um momento tão difícil como esse.
Cenário brasileiro
O cenário para 2021, porém, está afetado por problemas de curto prazo. Honda e GM (duas de suas três unidades) interromperam a produção. A Fiat colocará 10% do seu efetivo, em uma das três linhas de montagem de Betim (MG), em férias por uma semana e há rumores que também aconteça em Goiana (PE). O problema principal é a escassez de semicondutores (chips) que afeta a indústria automobilística no exterior e aqui.
Os veículos respondem por apenas 13% da produção mundial de chips e, portanto, ficam em desvantagem frente a computadores, telecomunicações e outros produtos eletrônicos. Essa situação pode se acomodar nos próximos meses, com a melhora da situação da pandemia em países do exterior.
Segundo Carlos Zarlenga, presidente da GM América do Sul, até junho deve se normalizar. Efeitos das novas rodadas de isolamento social também são difíceis de estimar, embora afete relativamente pouco a produção porque todas as fábricas já se adaptaram às medidas sanitárias.
O “custo do Brasil” atrapalha a indústria e seu crescimento
O levantamento da Anfavea aponta que a carga tributária sobre o automóvel no Brasil chega a 44% do valor do veículo em modelos com motor acima de 2.0 litros, que pagam IPI maior. Contudo, tem um detalhe: este percentual não inclui outros impostos, como o IPVA e o IOF cobrado no financiamento. Ou seja, essa carga de tributos é ainda maior.
“Está prejudicando as montadoras? Não. Está prejudicando também o fornecedor, o concessionário e toda a cadeia. E quem está pagando por isso é o consumidor. Enquanto cidadãos, pagamos uma carga tributária absurda para comprar um carro. Então, por favor, não duvidem dela. A carga tributária no Brasil é insuportável, ninguém aguenta mais. Nós queremos um sistema tributário mais equilibrado, simplificado e transparente para toda a sociedade”.
Luiz Carlos Moraes
Reajuste do ICMS em São Paulo – setor afetado mais uma vez
Reajustado pela primeira vez em 15 de janeiro, tanto para veículos 0 km quanto para usados, o imposto sofreu um segundo aumento em 1º de abril deste ano.
Apesar de o aumento da alíquota dos usados ter sido muito maior, em torno de 207%, é o valor dos 0 km que tem afetado mais a vida das montadoras em SP. Em janeiro, o percentual passou de 12% para 13,3% e neste começo de abril voltou a aumentar, com o imposto chegando em 14,5%, de acordo com o decreto n.º 65.454/2020.
Esses aumentos recentes do ICMS têm quase todas as montadoras a divulgarem as tabelas preços de seus lançamentos colocando um asterisco para avisar o consumidor que o preço em SP é diferente em relação ao dos outros estados.
Em média, cada veículo 0 km vendido em SP tem ficado entre R$ 1 mil e R$ 3 mil mais caro, dependo do modelo, por conta do ICMS. A finalidade em aumentar a alíquota do ICMS é de gerar receita para os cofres públicos, que estão cada vez mais prejudicados pela pandemia de covid-19.
Projeções de crescimento ainda exigem cautela
A ANFAVEA prevê aumento de 15% no licenciamento de autoveículos, 9% nas exportações e 25% na produção, índices insuficientes para a retomada a patamares de 2019, pré-pandemia. Para máquinas, a expectativa é de crescimento de 7% nas vendas, 9% nas exportações e 23% na produção.
“Nunca foi tão difícil projetar os resultados de um ano, pois temos uma neblina à nossa frente desde março, quando começou a pandemia”, explica Luiz Carlos Moraes. Infelizmente, observamos uma segunda onda de covid-19 que chegou também ao Brasil. E sabemos que uma imunização pela vacina será um processo demorado, que tomará quase todo o ano, impedindo uma retomada mais rápida da nossa economia. Some-se a isso a pressão de custos, as necessidades urgentes de reformas e surpresas desagradáveis como o aumento do ICMS paulista, e temos diante de nós um quadro que ainda inspira muita cautela nas nossas previsões”, resume o Presidente da ANFAVEA em release apresentado pela associação. (https://anfavea.com.br/docs/release_coletiva_08_01_2021.pdf)
Apesar da paralisação de algumas fábricas na última semana do mês por falta de insumos ou feriados antecipados pelo agravamento da pandemia, várias montadoras conseguiram, num esforço logístico, completar unidades que estavam paradas nos pátios com alguma peça faltando.
O melhor resultado no acumulado do trimestre foi o das exportações, de 95,8 mil unidades, volume 7,6% superior ao dos embarques do início de 2020. O estoque de veículos nas fábricas e nas concessionárias se mantém estável num patamar baixo, de 101,1 mil unidades. Também chama a atenção a relativa estabilidade do nível de empregos diretos – 104,7 mil postos entre as montadoras de autoveículos. Para o próximo trimestre, a expectativa é de uma travessia penosa até uma aguardada melhora no segundo semestre.