Já falamos sobre a crise dos semicondutores e uma previsão da Volkswagen de que ela pode durar até 2024. Como esse problema abrange toda a indústria automobilística e vários segmentos além dela, isso seria realmente grave para o mercado mundial.
Várias montadoras já suspenderam a produção por falta desse e de outros componentes. A origem da atual crise automotiva global se encontra em vários fatores, que vão desde a pandemia e a guerra na Ucrânia até o incêndio de uma fábrica chinesa, como veremos.
O que são os semicondutores?
É muito comum ver as pessoas fazendo uma confusão entre semicondutores e microchips. Na verdade, os semicondutores são componentes que conduzem correntes elétricas e servem como base para os chips em geral, que são peças mais abrangentes.
Tanto que os microchips não são exclusivos da indústria automotiva, sendo aplicados também na fabricação de computadores, celulares e até videogames.
Só mais recentemente, com os veículos autônomos e elétricos, é que eles começaram a integrar mais fortemente a indústria de carros.
Um dos materiais semicondutores mais comuns do mundo é o silício, daí que as placas de silício sejam a base de vários eletrônicos como computadores e televisores.
O próprio Vale do Silício, polo histórico de tecnologia e de informática localizado na Califórnia (EUA), leva o nome por esse motivo.
Já transistores e diodos são exemplos de componentes feitos de materiais semicondutores. Assim, tais componentes são fundamentais para a fabricação de microchips, especialmente para a indústria automobilística.
Semicondutores: por que faltando?
Hoje em dia os automóveis utilizam de 1000 a 1500 semicondutores, conforme explica Cássio Pagliarini, consultor automotivo da Bright Consulting.
“Isso depende da sofisticação e da quantidade de equipamentos que o veículo tenha. Os semicondutores podem ser desde um transistor ou um diodo, que são mais simples, até circuitos impressos e mais complicados”, complementa.
Ao falarmos da crise hoje vivida pelo setor automotivo, não podemos deixar de citar a pandemia de covid-19, que se iniciou no começo de 2020.
“Em abril e maio de 2020 a indústria automobilística chegou a perder 75% do seu volume”, esclarece Pagliarini. “Com isso, as montadoras de carro reduziram o consumo de peças e partes para fabricação”.
Ao mesmo tempo, por conta das quarentenas realizadas no mundo todo, o uso de computadores, games, televisores e afins cresceu vertiginosamente. Vale notar que a indústria desses eletrônicos paga melhor do que a automobilística.
Assim, não é difícil imaginar o impacto que isso causaria no médio e longo prazo. “A crise automotiva só não começou antes, graças aos estoques em trânsito, cuja logística pode demorar de quatro a cinco meses para atingir uma montadora”, diz Pagliarini.
Incêndio piorou a situação
Lembrando que, em março de 2021, a japonesa Renesas Eletronics, importante fábrica de semicondutores, sofreu um incêndio que agravou ainda mais a situação da indústria automotiva em geral.
Para se ter noção, com o acidente cerca de 30% das peças do mundo todo foram afetadas. Além disso, o efeito em cadeia é tanto que não só a Renesas, mas também a Honda, a Nissan e a Toyota perderam valor de mercado em suas ações.
Mais recentemente, novas crises em decorrência do covid-19 também voltaram a ocorrer na China, impactando ainda mais o setor. Com isso, a indústria automobilística ficou no fim da fila em termos de produção e venda de semicondutores e microchips.
“Passada a fase dos estoques em trânsito, o Brasil começou a sentir a crise”, complementa Pagliarini.
Foi a partir de 2020, mas sobretudo em setembro de 2021, quando a queda de produção fez com que a indústria automobilística nacional tivesse o menor estoque de veículos novos.
“Somando montadoras e concessionárias, havia por volta de 75 mil veículos estocados. Sendo que no Brasil é preciso algo entre 150 mil e 200 mil automóveis para uma venda normalizada”, conclui.
Qual a situação atual e futura?
Ainda faltam semicondutores e componentes em geral, mas provavelmente no médio prazo esse não será o problema maior, mas sim os impactos que a crise vai acabar deixando ao longo do tempo, como a queda geral nas vendas.
Essa queda também ocorre por vários motivos, seja porque os carros estão cada vez mais caros, seja porque a recessão faz com que as pessoas encontrem outras soluções de locomoção e acabem se acostumando com elas, como o transporte por aplicativo.
Até porque, novas fábricas surgiram nesse segmento de semicondutores e microchips, tentando aproveitar a oportunidade. O problema é que o período de inércia delas é muito grande, ou seja, elas demoram muito para começar a produzir e atender a demanda reprimida.
“No fim deste ano nós já teremos o suprimento de semicondutores voltando a um nível bom”, explica Pagliarini. “Só que eles chegarão em um momento em que o número de clientes terá caído. Então, provavelmente a restrição de venda ocorrerá não por falta de componentes, mas sim de clientes lá na ponta, para comprarem os veículos”, finaliza.